segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Resenha: Project Black Pantera – Project Black Pantera (2015)



A história da humanidade é coberta por inúmeros atos cruéis e preconceituosos, fatos estes que posso enumerar facilmente visto nossa vasta ignorância e preconceito. Inquisição, guerras mundiais, corrupção e escravidão mancham de sangue nossos livros de história, transformando nossa raça em uma das mais violentas dentre os animais.
A música, em especial o Rock/Metal, sempre foi libertária e contrária a estes tipos de opressões. Desde o período clássico, a música vem expressando nossos descontentamentos, seja eles a favor ou contra o ponto central da questão. O fato é que não tem diferença entre Mozart e Steve Harris, visto que ambos pavimentaram suas músicas através do concreto cultural e expressivo de nossa humanidade.
Formada em 2014, a banda Project Black Pantera, provinda de Uberaba (Minas Gerais), também escreve suas músicas com esse lado expressivo de nossa história, tanto que o nome da banda tem ligação cultural com o partido dos Panteras Negras.
O partido dos Panteras Negras, que foi fundado em 1966 na cidade de Oakland, Califórnia, foi uma organização política extraparlamentar socialista revolucionária norte-americana ligada ao nacionalismo negro. O objetivo do grupo, no princípio, era patrulhar guetos negros para proteger a população dos atos de brutalidade por parte da polícia, no qual eles acusavam de ser racista. Após o crescimento do grupo, os Panteras Negras adotaram uma filosofia revolucionária e marxista que defendia o armamento dos negros, além de exigir a isenção dos impostos e de todas as sanções da então chamada “América Branca”. Lutavam também pela libertação de todos os negros da cadeia, e tentavam forçar o governo a pagar indenizações por “séculos de exploração branca”.

O debut autointitulado do power trio é simplesmente espetacular, e assim como o programa dos dez pontos dos Panteras Negras, onde o grupo listava pontos que desejavam e acreditavam, o disco veio com exatas 10 faixas, mais dois bônus.
O álbum abre com um soco na cara chamado “Boto Pra Fuder”. A canção é direta e pesada. O baixo distorcido faz uma ótima base para o canto que arrebenta. Tanto a “Boto Pra Foder” quanto a segunda faixa, “Ratatatá” (que por sinal tem ótimos slaps), são de cunho viciantes e empolgantes.
Todas as faixas do disco são de um estilo muito particular, tanto que não consigo rotular o trabalho do Project Black Pantera – somente que é uma variação de Thrash, Hardcore, Punk e Crossover. Mesmo cantado em português, a banda tem um leque de críticas favoráveis em países como França e Estados Unidos, mostrando a força artística do grupo.
A parte gráfica e física do CD são bem criativas. A logomarca, composta por Rauy Cardoso, junto das imagens feitas por Andreza Rodrigues, são marcantes e dão seriedade ao trabalho. Uma foto que me chamou a atenção é uma onde os membros estão de punhos erguidos. Esse gesto (raised fist) é um símbolo dos Panteras Negras. Na Olimpíada da Cidade do México em 1968, Tommie Smith e John Carlos, atletas afro-americanos, fizeram essa saudação durante a cerimônia de premiação da modalidade, após vencerem os 200 metros rasos, por julgar o ato dos atletas como sendo uma manifestação política, ambos foram banidos dos Jogos pelo Comitê Olímpico Internacional.

O álbum segue com a monstruosa instrumental “Godzilla”, esta que abre caminho para uma das melhores faixas do disco, “Eu Sei”. Sendo intencional ou não, a letra de “Eu Sei” retrata um pouco o pensamento da ala mais radical do movimento dos Panteras Negras, que defendia a luta armada e pregava que o governo branco omitia a verdade e vendia uma falsa visão de paz e igualdade:
“Omitem a verdade, eu sei, paz e igualdade, pra quem? Quer cair pra dentro, então vem!”
A ferocidade continua com a faixa “Rede Social”, onde a banda destila críticas a indivíduos que abusam das redes sociais de forma politicamente incorreta. A canção tem um groove marcante e pavimenta o caminho para a música mais Hardcore do disco, “Abre A Roda e Senta O Pé”, que é um convite irrecusável ao moshpit; destaque para o solo de baixo executado com muita pegada por Chaene da Gama ao 1:48 minuto.
“Execução Na Av. 38” e “Manifestação” são dignas de aplausos, o Thrash/Crossover com pitadas de Hardcore são muito bem amalgamados, mostrando toda a capacidade inovadora do grupo. Nos bônus, podemos encontrar uma versão em inglês para “Manifestação” e uma mixagem diferente para a “Execução Na Av. 38” feita pelo site norte-americano Afropunk, contendo a participação do rapper J. Cole.
Simplesmente matador esse primeiro trabalho do Project Black Pantera! Músicas agressivas e bem compostas junto ao verniz histórico dos Panteras Negras faz deste debut uma obra de arte. Para encerrar, vou deixar aqui as frases finais recitadas por Charles Gama na música “Escravos”:

“Todos nós nascemos livres e assim tem de ser,
Mas a prisão ainda existe, até um cego pode ver
Todos nós somos iguais, somos todos filhos de Deus
Tanta guerra não traz paz, a cor do teu sangue é igual ao meu.”

Integrantes:
Charles Gama (guitarra/vocal);
Chaene da Gama (baixo/vocal);
Rodrigo Pancho (bateria).
Faixas:
01 – Boto Pra Fuder
02 – Ratatatá
03 – Godzilla
04 – Eu Sei
05 – Rede Social
06 – Abre A Roda e Senta O Pé
07 – Execução Na Av. 38
08 – Manifestação
09 – Ressurreição
10 – Escravos
Bônus:
11 – Manifastation
12 – Execução Na Av. 38 feat. J. Cole (Mix By Afropunk)